sábado, 15 de fevereiro de 2014

Perfume

É bem possível que você ainda use o mesmo perfume. É possível também que qualquer pessoa que passou por sua vida, quando sentir o seu perfume, lembre-se de você. Do som da sua voz, da sua imagem a sorrir ou a chorar, preocupado, destemido, irritado... É bem possível que nesse momento todos os momentos vividos venham à tona, como um náufrago que acaba de saltar do barco que afunda e, num átimo de segundo – só o tempo de aquele cheiro familiar chegar às suas narinas e inundar seu corpo e cérebro de sensações – tudo, tudo o que viveram e o que deixaram de viver também foi revivido.
É bem possível que eu também use o mesmo perfume. E que qualquer pessoa que também me conheceu se lembre de mim.
Mas, eu sei, a ciência sabe, a filosofia – mais que ciência – que ninguém, com o passar do tempo é mais o mesmo. Não somente pelo que nossas células fazem, mas pelo que nosso interior sabe. Não somos os mesmos e nada é igual. Nem o seu cheiro. Nem o meu. Nem nossas lembranças, nem nosso passado, nem nosso futuro. Muito menos nosso presente.
Quem pode saber o que seria se? Quem pode prever o talvez? Quem pode intervir no que não houve e jamais haverá? Ainda que seu perfume seja o mesmo, ainda que o meu seja igual, o que deixou de acontecer... Já era! E o que já foi não pode ser mudado.
Qual o aroma do seu cheiro? É aroma de aconchego? É aroma de paz? É aroma de desassossego? Aroma de lembranças? Seu cheiro lembra o que? Das pessoas que você fez chorar? Das pessoas que o abraçaram? Dos lugares em que esteve? Com quem?
Um cheiro pode ter mil significados para você. E, talvez, seja apenas resquício de uma vida que poderia ter sido e não foi.
Meu cheiro, eu tenho certeza, é de coragem. Tive muito medo de viver. Mas, muito mais medo ainda de não viver. Por isso resolvi que muito mais tinha a perder se não desse o primeiro passo rumo ao abismo. Caí... Mas, quando percebi, eu tinha asas!!! E voei! Hoje estou no ninho sossegada, mas não apegada. Ainda posso voar e ser feliz sempre, assim como sou feliz sempre na segurança do meu ninho!
Meu cheiro é de dor e de alegria misturada. Meu cheiro é de amor e ressentimento. De mar e de terra. Meu cheiro é o da minha casa. Da minha cama. Do meu jardim e das ervas que eu planto. Das roupas que eu sujo e das que eu lavo. Do meu marido. Da minha filha. Das amizades duradouras e das que se foram.
Meu cheiro é de família e de amores que já não são. Mas, que me fizeram. Pode ser que você goste do meu cheiro. Ou que já tenha gostado dele. Não importa. Ele é meu. E, ainda que eu mude meu perfume, ele ainda será meu. Porque essência é o cerne, aquilo que se esconde onde não se percebe.
Perfumes podem lembrar a saudade que temos. E também podem libertar lembranças já esquecidas. Têm poder de nos transportar no tempo e levar-nos aonde jamais fomos. A essência da vida... Que segue, que rompe barreiras ou que as coloca no caminho...
Tudo isso em um perfume.
De que? Sei não... Só sei que meus pés saíram do chão... E, de repente, estava onde já quis e não quero mais estar. Porque os novos cheiros, os novos perfumes da minha vida me fazem seguir à diante, mesmo que olhe um pouquinho para trás para admirar a paisagem!!!

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