segunda-feira, 11 de janeiro de 2010

Na Roça




Era mesmo TPM... Mas as saudades permanecem - não é sem motivo que o Post que inaugurou este Blog se chama Maria da Saudade.

E hoje amanheceu mais um lindo dia azul. E gosto até quando venho trabalhar de ônibus porque eu não me preocupo com o trânsito, então posso ver tudo, tudinho.

Eu estou de volta à casa dos meus pais, que moram numa cidade satélite aqui do Distrito Federal.Para mim, é a cidade mais linda da região. Faz um friozinho gostoso por lá, e é cercada de lindíssimas paisagens.

Meus olhos jamais se cansaram de ver.

Mas, durante o trajeto para o trabalho, passamos pelo Torto, uma baixada pela qual se passa e onde há a propriedade que um dia foi do meu avô materno, e onde fica também o Córrego do Torto que desemboca no Lago Paranoá.

Eis que passando por lá, vejo aquele riozinho e sinto um cheirinho de mato, de cerrado... E as saudades me inundaram como se a chuva fizesse uma tromba d'água naquele vale cujo sol ainda nem havia tocado. Fui, junto com minhas lembranças, transportada para o sítio que tínhamos em uma outra cidadezinha das redondezas.
A casa era simples. O chão era de cimento queimado com vermelhão. Quando compramos a propriedade - eu me lembro bem - ainda não havia energia elétrica. E havia um cavalo lindíssimo que ninguém havia conseguido domar, por isso foi deixado lá.
Abaixo, após o quintal, ficava o curral. E lá no fundo da propriedade - mas não muito longe da casa - ficava a residência do caseiro e o córrego que passava quase nos fundos dessa casa.

Indo caminho adentro, ficava o pomar bem próximo à mata ciliar e pertinho de uma nascente de águas azuis. Mais acima a plantação de abóbora, mandioca, milho, etc.

Voltando à casa, eu ainda me lembro do cheiro daquela construção e seu telhado sem forro. E do som de metal que fazia o catavento. E do barulho peculiar do vento batendo na copa do pinheiro que ficava no portão de entrada da casa.

Aquela passagem de ônibus me comprou outra muito mais valiosa por um tempo que só volta agora dentro de mim.

Voltam as sensações do banho nas águas verdinhas do córrego. Voltam na lembrança da minha mãe lavando a roupa perto da gente, enquanto brincávamos. Voltam ouvindo a cachoeira e a roda d'água. E no tempo que eu passava na pedra ouvindo o silêncio das águas e do mato.

O passado morava no mistério da curva do rio que eu nunca tive coragem de dobrar. E naquela borboleta enorme e azul que todos os dias vinha me espiar.

Meus olhos tinham um horizonte de montes e céus para descansar. E repousavam, lá da rede, naqueles verdes de milhares de matizes que coloriam os arredores.

Eu ainda posso escutar nossas risadas de crianças, e os sons dos nossos pés correndo apressados para todos os lugares daquele sítio.

O cheiro da resina da mutamba. O sabor das mangas. O perfume das limas. O cheiro da palha do milho e da pamonha quentinha. O leite ferrado com matruz... Ah... Aquela cozinha! E o seu fogão à lenha de vermelhão!!! A cinza misturada com água para as panelas não ficarem pretas!

Aquele quentinho gostoso durante o frio de junho.

A fogueira de junho!!! Que maravilha!!! Histórias e mais histórias... O rosto quente e as costas frias - Hehehehehehehe!!!

Os vagalumes! Como é que a gente conseguia pegá-los naquela imensidão, sendo tão pequeninos? Há coisas que, definitivamente, só crianças sabem fazer.

E o curral? Meu Deus! O curral! Os bezerrinhos tão molinhos e encolhidinhos. Ou de focinhos amarrados aos pés das suas mães para que a gente lhes roubasse um pouco do seu leitinho! Tadinhos!!!

E a fumacinha saindo das canecas de leite morninho...

Os passeios à cavalo... Era quando ir sem rumo para lugar nenhum era maravilhoso. Os pocotós eram divinas melodias que eu parava só para ouvir um canto de pássaro diferente...

Como é que a saudade pode me abandonar? São tantas coisas maravilhosas para lembrar.

Mas, o que eu queria mesmo era que, nesse dia tão azul, o tempo voltasse só por um dia no meu sítio. Só para eu ouvir novamente aqueles sons, sentir aqueles cheiros e ver aquela beleza... E provar os sabores que só havia ali, misturados aos outros sentidos da minha vida.

Naquele tempo a única razão que eu tinha para viver era a própria vida. Nada mais. Então tudo aquilo me bastava.

Acredito que foi por isso que hoje o Torto me levou água abaixo para dentro de mim mesma. Será que nunca mais a única razão para viver será a minha própria vida?

Sei que não há caminho de volta pelos caminhos da existência que se cimentam em tantas outras. Sei que elas estarão conosco para sempre e sempre. Sei que os afazeres me consumirão dias e dias. Sei que a trajetória é longa. Sei que cansa.

Mas, foi preciso apenas um átimo de segundo para eu viver anos e anos novamente. E... Sabem? Meu corpo ainda está fresquinho daquele mergulho, daquele vento e daquele aroma...

5 comentários:

Sara disse...

Que lindo Gabi, pude sentir contigo todo esse viver pelo simples prazer da vida...se fossemos capazes dessa simplicidade a felicidade nos visitaria mais vezes...pena que somos caçadores do saber e abandonamos a pérola da simplicidade em troca das turbulências do cotiano né...ainda bem que matamos as saudades por estes cantinhos net a fora...beijinhos essênciais..

Dom Rafa disse...

Sabe de uma coisa? Você me deixou com saudades dos vagalumes. Morava em uma casa em 1986-89 onde toda noite era iluminada de vaga-lumes e pirilampos. Eu catava eles no cair da noite e soltava antes de dormir (pra catar no dia seguinte). Me mudei. Voltando pra mesma casa em 96, NUNCA mais vi nada de vaga lume por ali. Maldita urbanização, que deu sumiço na bicharada...

Gaby Avelar disse...

Sabe, Rafa, que meus pais, há pouquíssimo tempo, moraram em uma casa lá no Setor de Mansões de Sobradinho, em um condomínio... E um dia, eu estava no quintal com meu cachorrinho, e eu não acendi as luzes. Qual não foi minha surpresa quando eu vi alguns vagalumes trazendo estrelas para perto de mim. Fiquei extasiada! Mas, nem de longe estava como lá no sítio, que parecia que estávamos flutuando no céu. Tudo de bom!

Elisa Avelar disse...

Oi flor...
Saudades de vc também.
Está muito sumidinha, hein?
O passeio ao Rio realmente foi muito gostoso. A ADri é uma flor, um encanto de pessoa, vc precisa conhecê-la.
Um beijo, querida.
Smac!

Anônimo disse...

Olá Gabrielle, gostei de suas páginas e forma com que escreve; inclusive este post me fez relembrar da simplicidade, do respirar e do viver. Gostaria de lhe deixar uma citação à qual acho muito bonita, espero que goste:

"Não importa o sentido DA vida, e sim um sentido NA vida."

Abraços Marco

"Eu sou o mesmo livro, podes ler"...

Mudou – Taiguara “Mudou! Mudou o tempo e o que eu sonhei pra nós Mudou a Vida, o vento e a minha voz, Mudou a rua em que eu te conheci. ...